19/07/2017

A persistência da memória, Salvador Dalí



“Toda a minha ambição no campo pictórico é materializar as imagens da irracionalidade concreta com a mais imperialista fúria da precisão”

A obra é como uma paisagem desértica. Ignorando os relógios derretidos por um momento, você sente que se estiver nessa paisagem o tempo não tem muito peso. Você poderia secar lá e morrer e ninguém iria se importar. Mesmo na água no fundo, não há ondas nela, é como se tivessem tido tempo de se acalmar. Literalmente não há atividade! Há esse insuportável senso de quietude. Literalmente o tempo derreteu, certo? Mas temos esse ambiente absurdo, a representação muito naturalística. Mas o que está sendo representado não é nem um pouco naturalístico...

A flacidez dos relógios dependurados e escorregando é um conceito brilhante, mais eficaz para abalar nossa crença em uma ordem natural de coisas, presa a regras estabelecidas, do que muitas deformações mais sensacionalistas. As imagens chegam ao inconsciente, evocando a preocupação humana, aparentemente universal, com o tempo e a memória. Um ataque racional!

O próprio Dalí está presente, na forma da cabeça adormecida que já havia aparecido em outros quadros, como no quadro O Jogo Lúgubre. Seu autorretrato caricaturado, está no plano central da obra, coberto por um relógio derretido. Os cílios sugerem um grande olho fechado em estado de contemplação, do sono ou da morte
Dalí propõe que apenas a superação do tempo “terreno” pode soltar as rédeas da consciência.

Ele alegou que a ideia para o quadro lhe ocorreu quando meditava sobre a natureza do queijo Camembert. Um dia, sentado diante dos restos do jantar, Dalí reparou que seu queijo camembert havia derretido e começava a se espalhar pelas bordas do prato. Foi a imagem daquele queijo que deu ao pintor a ideia dos relógios derretidos. O fundo de Port Lligat, em Barcelona, já estava pintado, portando foram necessárias apenas umas duas horas para terminar a pintura. Percebe-se que o pintor ilumina os penhascos e o mar com uma luz transparente e melancólica. Parece que está no pôr-do-sol, e é como se falássemos: Outro dia acabou, quem se importa?

As únicas criaturas vivas no quadro são as formigas que estão atraídas por um pedaço de metal e não por um pedaço de carne podre. Elas estão corroendo um pedaço de tempo, fascinante nao? E uma mosca no relógio derretido, ambos à esquerda. Dalí odiava formigas e as inclui neste quadro como um símbolo de podridão.
O tempo nos controla e está tão associado à cultura industrial na qual vivemos e aqui ele responde ao ambiente.
Quando Gala, sua esposa, que tinha ido ao cinema, voltou, previu corretamente que depois de ver A Persistência da Memória seria impossível que uma pessoa a esquecesse.


Esta pintura traduz o interesse do pintor pelas conquistas da ciência moderna, cruzando teorias mais abstratas de física, nomeadamente a relatividade de Einstein, que colocou em causa a ideia de espaço e tempo fixos, com as pesquisas de Freud relativamente ao inconsciente e à importância dos fenômenos dos sonhos. A duplicidade de sentido das imagens e as inúmeras interpretações que promovem assim como a tendência para a criação de cenas absurdas repletas de signos indecifráveis, levaram a Dalí a designar esta forma de arte de crítica paranoica, em tudo oposta a uma visão racional do mundo. 

Mais uma vez o desejo sexual faz parte de uma obra de Dalí, numa relação entre duro e macio: os relógios derretidos e disformes estão ligados à impotência, ao contrário do vermelho, o único duro, mas que não tem serventia, pois está sendo destruído pelas formigas.  Este relógio pode estar fazendo uma alusão ao órgão sexual do pintor.

Todos os relógios estão marcando horas diferenciadas, como se não existisse um tempo real, mas apenas a inconsciência, que não tem espaço ou tempo.

Esta é uma das composições mais conhecidas de Salvador Dalí.

Ficha Técnica
Onde ver: MoMa, Nova York, Estados Unidos
Ano: 1931
Técnica: Óleo sobre tela
Tamanho: 24cm x 33cm
Movimento: Surrealismo

Um comentário:

  1. Eu adoro essa pintura, gostei muito da análise... enquanto eu lia suas descrições, voltava na imagem do quadro para ver novamente... já disse e repito: adoro esses seus posts refletindo obras de arte ♥

    https://eueminhaestupidez.blogspot.com.br/

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